4.11.06

Muitos fins e muitos recomeços...

Fim de tarde. Fim de semana. Fim de feriado. São muitos fins e muitos recomeços em um ciclo doentio chamado vida.

Ao regressarmos de momentos lúdicos típicos de feriado (praia, piscina, churrasco, cerveja, mulheres, música, almoços etc) e chegarmos em casa, sentimos todo o cansaço acumulado e a vontade imensa de um banho e um breve e necessário cochilo. No entanto, se analisarmos a situação com mais calma, perceberemos que é algo mais do que cansaço o que sentimos: é o vazio. Depois de bons momentos de euforia e de relações tácteis com amigos e parceiros(as), regressamos para onde estamos sós. Ao nos encontrarmos a sós no quarto percebemos a própria solidão. Desejamos inconscientemente a permanência das boas sensações vividas há pouco, mas nos é impossível: resta-nos lembranças. Fica o vazio.

Os momentos de alegria e regozijo nos são raros. Logo retornamos ao cotidiano-regra: repetitivo, automático, solitário, enfadonho, triste. E é por isso que o fim do feriado é sempre sentido com melancolia. Não há melancolia maior que o pôr-do-sol que encerra o feriadão.

Esse é um momento que se repete na vida dos homens modernos. O cristianismo, enquanto religião, ou seja, como discurso ordenador da ordem simbólica do mundo, nos responde a essa situação de maneira completamente satisfatória, posto que absoluta: os prazeres da carne não satisfazem a sede espiritual. E, posto ser o espírito o que realmente importa, depois de lambuzar-nos no mundo pagão, sentimos a solidão interior – a ausência do Absoluto em nós: Cristo. É preciso, então, buscar o alimento espiritual, que nos remeterá a uma ordem transcendente – o reino dos céus.

Se pegarmos a explicação cristã e substituirmos Cristo pelo projeto existencial que mantemos, temos uma boa hipótese filosófica. Assim, aproveitamos o estar junto com outros para nos livramos de nosso próprio ser. Findo o contato, encontramo-nos a sós novamente com nossa própria liberdade. E aí não sabemos mais o que fazer; não sabemos se realmente curtimos o que curtimos ou se tão-somente lamentamos o encerramento do prazer vivido. O fato é que a melancolia (ou uma leve depressão) reina após o prazer. Talvez nos falte o transcendente. Mas a transcendência que se encontra não em uma outra realidade, mas no mundo da vida. A transcendência que se encontra em nós, naquilo que projetamos ser em um mundo hostil a espíritos sensíveis. Falta-nos estética.

Quando alcançarmos esse nível de auto-projeção, então os momentos pós-contato serão momentos extremamente estéticos; não mais aflição vazia – o Cristo pagão (Dioniso) terá sido alcançado. Da aflição e da angústia é impossível libertar-se, mas é possível, a partir delas, escrever belas poesias.

3 comentários:

Felippe Ramos disse...

Discordo em parte. Apenas seres desprezíveis aproveitam o estar junto com outros para livrar-se do próprio ser. O forte apenas quer viver a si mesmo mediante outros. Mas a realização de tal projeto de vontade de potência é inatingível absolutamente, posto que outros também têm seus próprios projetos. Do conflito surgem sínteses nas quais a aflição do não-sucesso é parte integrante. Mas o estar junto é condição de qualquer projeto individual. Daí o eterno retorno e busca do contato, mesmo estando-se consciente de que não se pode prever o que resultará do contato. Esta condição humana permite a vida em sociedade. É melhor estar mais atento das próximas vezes em que escrever.

Antonio Rimaci disse...

Discordo da discordância. O momento em que estamos em contato com outros cumpre uma função essencial para a vida social: é o momento em que construimos o nosso Eu para os outros. Nos termos do interacionismo simbólico, é a manipulação da impressão, a qual, quando é improdutiva, gera o embaraço. Nesse sentido, interagir é, de fato, a forma mais eficiente de fugir do que somos para nós mesmos, na solidão fria ( ou quente, atualmente) dos nossos quartos vazios...

Unknown disse...

Odeio quem me rouba a solidão sem em troca me oferecer verdadeira companhia, já dizia Nietzsche. Do que adianta você estar em meio outras pessoas se tem dentro de si mesmo que esse estar feliz temporário não passa de algo falso? Procurar a felicidade e a contentação interior em coisas que não sejam passageiras, penso eu que esta seja uma das buscas humanas. Abstrair coisas permanentes.